Aqui há uns anos, numa conversa em Berlim com um jornalista italiano do “Corriere della Sera”, questionava-me por que razão a Mafia nunca tinha decidido expandir-se para Portugal, como faz para outros quadrantes.
O meu interlocutor parecia não acreditar na legitimidade da minha dúvida e perguntou: “Então tu não sabes?”. Eu abanei a cabeça. “Não sabes mesmo?”. Voltei a fazer o mesmo. Ele esclareceu-me: “Mas que espaço é que a nossa Mafia ia ocupar se a vossa já tomou conta de tudo?...”.
Na altura aquilo soou-me quase a uma piada de mau gosto. Eu não era inocente, mas digamos que o meu aprendizado ainda ia a meio. Com o passar dos anos fiquei completamente convencido da veracidade das palavras do italiano.
Vem isto a propósito de uma das últimas atoardas do digníssimo e acima de toda a suspeita primeiro-ministro de Portugal, que se recusa a comentar o caso “Face Oculta” porque, segundo as palavras de José Sócrates, “não quero contribuir para uma sucessão de episódios que não têm dignidade nem contribuem para elevar a nossa vida pública”.
De facto, senhor primeiro-ministro, todos sabemos que o caso não tem qualquer dignidade. Já quanto à elevação da vida pública, estamos conversados - só se fosse para passar da cave ao rés-do-chão. Mas já agora, estando um amigo seu envolvido, não acha que seria de bom tom V.Exa esclarecer de uma vez por todas quem lhe paga para estar onde está, isto é, os portugueses?
Terá de ser o senhor procurador da República a divulgar as conversas que manteve com o seu amigo para, nas palavras de Pinto Monteiro, “esclarecer e acalmar o público?”. Não me parece, é tudo farinha do mesmo saco…
Que o público precisa de ser esclarecido, lá isso precisa. Mas está calmo, ao que tudo indica. Já o mesmo parece não suceder lá para os lados do Largo do Rato.
O Rato pode porém descansar – é que o digníssimo presidente do Supremo Tribunal de Justiça decidiu anular e destruir as escutas telefónicas, uma vez que estas serão “nulas e irrelevantes do ponto de vista criminal”… Boa, assim ficamos todos esclarecidos e muito mais calmos. Por que não haveríamos de estar? O regabofe continua...
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